instrumento recorrente em períodos de crise
Abilio Ferreira
O subsídio parcial de desemprego na Alemanha (ou compensação de trabalho a tempo reduzido - Kurzarbeitergeld) foi um dos principais mecanismos da política usado no decurso da crise económica e financeira mundial em 2008/2009. Quase 1,5 milhões de trabalhadores chegaram a beneficiar das prestações pecuniárias pagas ao abrigo desta medida durante a fase aguda dessa crise.
O subsídio parcial de desemprego foi considerado pela Organização Internacional do Trabalho (OIT) um mecanismo de sucesso naquele tempo de crise. Levou a um aumento moderado do número de desempregados e permitiu aos empregadores manter os trabalhadores durante o período da crise, evitando desta forma os custos relacionados com despedimentos e novas contratações posteriores de mão de obra. Permitiu nessa ocasião uma relativamente rápida recuperação da economia alemã, segundo concluiu a OIT.
Para combater os efeitos da pandemia da covid-19, o governo alemão decidiu alterar recentemente algumas regras para facilitar o recurso a este instrumento de proteção ao emprego. Está em curso o processo de apoio às empresas e trabalhadores atingidos pela crise. Trata-se de um processo dinâmico. Algumas novas regras têm sido introduzidas desde o primeiro anúncio destas medidas pelo governo federal, algumas delas, por sugestão dos parceiros sociais, pelo que esta informação reflete a situação à data de conclusão deste artigo em 7 de abril. Neste contexto, é conveniente conhecer-se algumas das regras básicas do trabalho a tempo reduzido (“Kurzarbeit”)
“Kurzarbeit” pressupõe concordância do trabalhador
O empregador não pode impor unilateralmente “Kurzarbeit”, a não ser que o contrato de trabalho preveja o contrário, o que normalmente não deveria acontecer. Não existindo um conselho de empresa, o empregador tem de celebrar um acordo com cada um dos trabalhadores. Desse acordo deve constar que o trabalhador concorda com a medida de “Kurzarbeit”. As agências de emprego exigem dos empregadores que, ao requerem os pedidos deste subsídio apresentem o correspondente acordo individual.
Se o trabalhador não manifestar a sua concordância com a medida, à entidade patronal não resta outra alternativa senão a de um “despedimento modificativo” (“Änderungskündigung”). Trata-se de uma alteração às condições contratuais até então existentes. Recebendo uma comunicação dessa natureza, o trabalhador poderá recorrer ao tribunal de trabalho dentro do prazo de 3 semanas para o caso ser avaliado juridicamente.
O acordo tem de ser transparente e preciso
Este acordo tem de preencher certos requisitos. O início e o termo do período de “Kurzarbeit” têm de estar definidos explicitamente. Além disso, as partes contratantes têm de determinar qual a modalidade de “Kurzarbeit” a introduzir.
Se não for acordada a total suspensão do trabalho, mas apenas uma redução do horário laboral, devem ser regulamentada a situação e a distribuição do horário de trabalho. De igual modo, deve estar expressamente regulamentado se os funcionários devem recorrer a horas extras ou ao banco de horas.
A entidade patronal pode aumentar voluntariamente o subsídio de “Kurzarbeit”. O trabalhador não tem direito a exigir essa compensação, mas pode valer a pena em cada caso negociar sobre o assunto.
Não assinar nenhum formulário em branco para ser preenchido
Por vezes, algumas entidades patronais apresentam aos trabalhadores um formulário de acordo sem detalhes precisos. Em muitos casos trata-se de modelos de contratos editados pelas organizações patronais e que refletem unilateralmente os interesses dos empregadores. Frequentemente reservam-se o direito de introduzir um período de “Kurzarbeit” segundo as suas conveniências sem fixar o respetivo início e o fim dessa medida.
Uma declaração desse género não deve surtir efeito por não corresponder às orientações definidas pelo Tribunal Federal do Trabalho. Segundo as mesmas, no acordo para introdução de “Kurzarbeit” devem constar de forma clara e compreensível para os trabalhadores quais os direitos e deveres aplicáveis nesse período.
Acordo ineficaz – um risco também para o empregador
Nesse caso, o trabalhador não deve assinar, mas chamar a atenção do empregador para essa lacuna e procurar aconselhamento. Além do mais, o empregador também pode colocar-se em apuros. É que, sendo o acordo ineficaz, e se o trabalhador colocar à disposição da empresa a sua força de trabalho, pode exigir o pagamento da totalidade do salário, considerando que o empregador ocorre então em incumprimento do contrato. Não interessa se a entidade patronal está ou não em condições de empregar alguém. Trata-se do risco operacional inerente à atividade empresarial. Na prática, significa que o trabalhador tem direito a receber a remuneração sem qualquer outro fundamento que não seja o da sua disponibilidade para o trabalho.
Mais facilitado o acesso a subsídio
De acordo com as medidas agora introduzidas pelo governo alemão e aplicáveis retroativamente a 1 de março de 2020, foram aligeirados os pressupostos para a atribuição de subsídio às pessoas em trabalho a tempo reduzido:
Subsídio pode ser pago a qualquer empresa, mesmo aos empregados em regime de trabalho temporário.
Se pelo menos 10 % dos trabalhadores forem abrangidos pela perda de trabalho, a empresa pode requerer trabalho a tempo reduzido para os atingidos. Em situação normal, esta medida só pode ser requerida quando, pelo menos, um terço dos empregados são afetados pela redução da atividade empresarial.
O subsídio é de 60 % da remuneração líquida anterior. Para trabalhadores com pelo menos um filho é de 67 %.
Neste sistema de “Kurzarbeit” as contribuições para a segurança social são devolvidas na totalidade às empresas pela Agência Federal de Emprego.
Não há necessidade de quem trabalha em regime de banco de horas ter de fazer primeiramente as horas em falta para que lhe seja pago este subsídio.
Os trabalhadores não têm de ter esgotado as férias do ano em curso antes de serem inscritos em “Kurzarbeit”. Esta norma aplica-se até 31 de dezembro de 2020, ou seja, os trabalhadores podem gozar as férias anuais planeadas. No entanto, têm de gozar previamente o saldo residual das férias de 2019.
Alargamento das possibilidades de acumulação de vencimento
Em situações normais, quando se recebe o subsídio por trabalho a tempo reduzido e se passa a exercer uma atividade complementar, a remuneração daí proveniente é considerada para o cálculo do subsídio.
Com as alterações introduzidas em 27 de março de 2020, esta norma foi aligeirada, passando a vigorar no período de 1 de abril a 31 de outubro de 2020 o seguinte regime especial: não são contabilizadas para cálculo do subsídio parcial de desemprego as remunerações provenientes de uma atividade profissional em profissões ou setores profissionais “relevantes para o sistema” e que tenha sido iniciada após a introdução da modalidade de trabalho a tempo reduzido. É o caso das pessoas que trabalhem em serviços considerados essenciais e especificados numa extensa lista variável conforme o estado federado (Land), da qual se salientam normalmente os setores da gastronomia, cuidados de saúde, alimentação, comércio de produtos alimentares (repositor de supermercado, p. ex.), transporte de mercadorias para abastecimento das superfícies de distribuição e venda, cuidados a crianças e a idosos, produção de alimentos incluindo a agricultura. Dessa forma, podem complementar o subsídio recebido, exigindo-se apenas que não seja ultrapassado o montante do ordenado auferido antes da entrada em regime de trabalho eduzido.
Como requerer o subsídio de “Kurzarbeit”
Compete às entidades patronais apresentar à respetiva agência de emprego os pedidos de desemprego parcial para os seus trabalhadores, mesmo que seja inferior a 1/3 o número de trabalhadores na empresa abrangidos pela perda de remuneração.
Também as empresas de trabalho temporário podem apresentar idênticos pedidos para os seus trabalhadores que se encontram em desemprego parcial neste período de pandemia.
Ambas as regras aplicam-se excecionalmente neste tempo de crise nos termos indicados.
Comissão Europeia anuncia medidas para preservar postos de trabalho
A pandemia do coronavírus tem levado à introdução de medidas sem precedentes em todos os Estados-Membros da UE.
Também a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, anunciou em 1 de abril de 2020 uma nova iniciativa de apoio para evitar que as empresas europeias cuja atividade tenha sido reduzida, ou mesmo suspensa no atual período de crise, recorram ao layoff ou avancem para o despedimento de trabalhadores. A Comissão pretende ajudar todos os países atingidos pela crise, mas particularmente a Itália e a Espanha.
Trata-se do novo programa „Sure“ (‘seguro’, ‘certo’ em inglês), que se baseia no conceito de trabalho de curta duração apoiado pelo Estado com verbas provenientes de Bruxelas, e tem como objetivo a preservação dos postos de trabalho durante o período de paralisação da economia. Segundo explicou von der Leyen, o objetivo é que as empresas não devem suspender os contratos dos seus funcionários apesar de não terem encomendas e de estarem sem trabalho por causa deste choque externo temporário do coronavírus. “São ilações retiradas da crise financeira de 2008”, quando alguns Estados-membros recorreram a instrumentos semelhantes que ajudaram milhões de trabalhadores a manter os seus empregos e as empresas a ultrapassar a crise financeira mantendo os seus funcionários, observou a presidente da Comissão Europeia.
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